8.12.06

Vaidade



Um dia recebemos a visita de uma tia-avó, irmã da minha avó materna, a tia Lázara. Ela era super falante, uma solteirona bem-arrumada, colorida e divertida. Não sei quantos dias passou lá, mas não me esqueço de uma noite, no quarto da minha avó, nós três conversando e minha avó costurando. A tia Lazara, mexendo em sua bolsa, sacou um batom, bem pequenininho, em embalagem transparente. Fiquei fascinada quando o vi e ela me deu pra ver. Passei o batom, bem vermelho, e para o espanto das duas, ficou perfeito, sem borrão nem nada. Recebi elogios pela mão firme e como tinha ficado linda de batom. Pronto. Essa noite marcou a minha vida. A cada visita, ela trazia batons de presente pra mim. Bastou isso pra eu me sentir mulher e me estimular a passos mais ousados...

Eu nunca fui muito moleca. Eu era meio paradona, preguiçosa, gostava mais de desenhar e brincar de boneca que de correr, por isso não sofria acidentes e nem aprontava muita coisa. Não cheguei a dar muito trabalho pra minha mãe.

Mas um dia, não sei quanto tempo depois da visita da tia Lázara - essa memória a gente acaba perdendo - resolvi fuçar o banheiro da minha mãe. Tranquei a porta e com a ajuda do bidê (ainda se usava bidê, mas naquela idade eu achava que era para lavar os pés antes de dormir) subi na pia. Abri o armário e me pintei com a maquiagem dela. Aquilo era o paraíso! Tinha modelador de cílios postiços, pós, cremes, sombras cintilantes, batons... Fiquei lá um tempão me divertindo até que bateram na porta. Era minha mãe. E agora? Comecei a lavar o rosto para esconder o que tinha feito e ela na porta:

- Filha, que você tá fazendo aí? Abre a porta pra mãe.

E eu naquela situação. Bastava descer da pia e inventar uma história qualquer, já que o rosto tava limpo, mas eu não pude. Subir foi fácil, mas descer... A pia era muito alta pro meu tamanho e minha perna não alcançava o bidê de volta. O desespero tomou conta. E minha mãe na porta, preocupada:

- Filha, abre a porta.
- Não posso, mãe, eu tô em cima da pia e não consigo descer...

E chorei. Chorei de medo de descer e vergonha por ter sido apanhada no flagra. Sentindo o drama, ela pacientemente me orientou na descida, pelo lado de fora da porta, pedindo para eu escorregar a barriga de leve pela pia, descendo devagar até encostar o pé na ponta do bidê. Se não desse, era só dar um pulinho no chão. Pronto. Salva, envergonhada e com a barriga dolorida, abri a porta, achando que levaria uma bronca, mas o que encontrei foi uma mãe aliviada por ver que estava tudo bem e logo tratou de me orientar a nunca mais trancar a porta do banheiro. Só sendo mãe mesmo pra entender a aflição dela do outro lado.

Se a tia Lázara imaginasse o resultado que daria aquela sementinha vermelha que ela me deu...

3 comentários:

Anônimo disse...

Lalá, descobri seu segredo! eh eh eh
Bem, parabéns pelo blog!! Estou feliz por sua inciativa e, também, por ser o primeiro a fazer um comentário em sua página. Gostei muito dela, de seus textos e, inclusive, das razões que a levaram a criar um blog. Lendo a sua descrição da página, identifiquei-me de imediato. Também cultivei, por muito tempo, a noção de isso era coisa pra exibicionista etc. Mas, depois, vi que não. Acredito que, em grande medida, escrevemos para nós mesmos, seja para revitalizarmos nossas mentes, seja para exorcizarmos nossos fantasmas...
É um hábito acima de tudo fascinante. Compartilhado, torna-se mágico. Você vai perceber.
Bem-vinda ao mundo dos blogueiros. Tenho certeza de que vai se apaixonar (ou se viciar).
Você, que já era minha leitora número um, agora ganhou um fã.
Beijão e boa sorte!!!

Wagner

Anônimo disse...

Descobri você aqui-i! Que bom... Quero mais historinhas gostosas! Ah, e bem-vinda ao clube!
Beijinhos... :o)

Ana Laura disse...

Gente, sou uma tonta!
Só agora descobri seus comentários!!! Ainda estou aprendendo a mexer com essa modernitude...
Obrigada pelas palavras encorajadoras!